terça-feira, 28 de setembro de 2010

A Tumba de Humayun

Eu às vezes aqui me sinto em Indiana Jones, de tumba em tumba a visitar. Já sei de onde veio toda a inspiração pra aqueles filmes. Os islâmicos que dominaram esta região eram fissurados por construir tumbas para si mesmos, mausoléus para amores ou amigos, e coisas do tipo. Fizeram um monte no tempo em que dominaram esta área, entre os séculos XIV e XIX (até a derrota para os ingleses, que então "libertaram" os hindus do jugo islâmico, hehe sabem como isso funciona). São dos monumentos mais belos da cidade, então tenho passeado bastante.

Depois dessas duas semanas, desde que cheguei, meus dias entraram numa certa rotina: alguma entrevista ou algo relacionado à minha pesquisa pela manhã ou começo da tarde, e em seguida um bordejo pela cidade pra visitar algo ou pra sair às compras (hehehe). Essa segunda-feira, por exemplo, foi um caso bem ilustrativo.

Pela manhã saí pra uma entrevista que tinha marcado num centro de pesquisas energéticas (eles estão com algumas coisas em biocombustíveis). Fui de metrô, evitei os tuk-tuks e da estação fui a pé. Chegando lá o diretor miserávi me fez esperar um século e depois ainda estava com uma cara de tacho. As secretárias, e até os seguranças, são quase sempre muito mais simpáticos. Bom, saí de lá com o trabalho feito e fui procurar um lugar pra almoçar. Delhi é uma cidade extremamente hostil a pedestres: as distâncias são longas, sinal de trânsito, quando existe, frequentemente não funciona, aí fica o guardinha que às vezes apita e às vezes vai conversar com os colegas, e você nunca sabe quando aquela maré de motos e tuk-tuks vai dar a largada em direção a você. E, ah, Delhi normalmente não tem nome de rua. Pra quê?

Ruas sem nome em Nova Délhi. Só as avenidas principais têm nome. No resto, Deus te abençoe. Vá com GPS. Os endereços são tipo "Bairro tal, Casa R-14", e aí vá procurar onde ficam os Rs e de onde começa a numeração. Boa sorte.
Apesar de tudo, graças à perseverança e ao guia Lonely Planet (hehe), achei um lugar pra comer. Comida boa e barata, como é comum aqui. O estilo era tipo padaria aí do Brasil, sempre com o detalhe do local de apreciação religiosa ali pra dar bons auspícios ao comércio do dia. Veja ali o altarzinho atrás do balcão junto da geladeira da coca-cola.

Note o pequeno altar ali perto da geladeira da coca-cola, com uma vela, um breve incenso e algumas imagens de Sai Baba, santo venerado nesta região da Índia (as tradições religiosas variam dependendo de onde você está no país, mas depois a gente fala disso). (Também não confundir com Sai Baba o guru que ainda está vivo; este diz ser a reencarnação do santo, alguns acreditam, outros não).

Estou saboreando minha comida, meu delicioso lassi (iogurte grosso batido com açúcar, servido tradicionalmente gelado numa cumbuquinha de barro), e de repente eu ouço a língua mais bonita do universo, russo. Suspendi a cabeça igual cachorro quando ouve barulho. Vinha um casal já brigando com o garçom. (Casal de meia idade viu gente, antes que imaginem alguma tenista estonteante). Lembram o que eu disse sobre o chai já vir pronto e ninguém perguntar como você prefere? hehe, o tio russo não gostou. Em um sotaque carregadíssimo (que eu não posso fazer aqui, mas que terei prazer em imitar quando nos vermos pessoalmente), "Sem leite! No milk! Eu pedi chá preto!!".

Nesses lugares, junto com a comida vem o famigerado copo d´água. Naqueles copos estilo extrato de tomate, uma água que Deus sabe lá de onde veio. A recomendação é não tomar, então faz-se aquela cara amarela pra o garçom e larga o copo de escanteio. Na sobremesa caí na besteira de pedir um bolo de abacaxi que na verdade foi um verdadeiro abacaxi. Lição aprendida: na Índia, coma coisa indiana, indiano quando se aventura em comida ocidental quase sempre faz cagada (Seu Bhalla, por exemplo, se refere a ketchup como "o molho", e come com pão puro).

Na saída, dei de cara com uma híjra, éééé... aqueles travestis que são chamados de "o terceiro sexo", e que pedem dinheiro a você senão lhe seguem, fazem escândalo e lhe rogam praga. Eu não queria nem uma coisa nem outra, nem dar dinheiro nem receber praga de traveco. Ele(a) estava parando os transeuntes, pegou um casal que ia na minha frente. Eu escapei pela tangente antes que ele(a) viesse em mim.

Na solina tipo 2h da tarde em Feira de Santana (peguei até uma corzinha), saí andando em direção a um monumento "próximo". Foi o forte de Purana Qila, habitado pelo imperador Sultão Humayun no século XVI. Esse império islâmico a que me refiro, que dominou esta região, foi o Império Mogol (não confundir com Mongol; o mogol, ou mughal em inglês, se originou no Afeganistão, e dizem ter origem nos descendentes de Gengis Khan, daí a semelhança do nome).

Entrada para o forte e cidadela de Purana Qila, construída no século XVI pelo Sultão Humayun e seus sucessores. Em Nova Délhi.
Dentro, quase sempre uma mesquita, como neste caso. Numa coisa a novela acertou: essas ruínas são verdadeiros points de encontro para namorico de casais. Muitas Mayas e muitos Bahuans pelas ruínas, assim como mendigos tirando uma soneca também.

Frente da mesquita construída em Purana Qila. Hoje não funciona mais, mas é o prédio mais inteiro desse complexo de ruínas.

Humayun foi derrotado e forçado a voltar pra o Afeganistão por Sher Shah, que tomou esta área e continuou as construções, como esse observatório aí abaixo. Pouco depois Humayun pediu ajuda aos Persas e retomou esta área, e transformou esse prédio aí abaixo em biblioteca para ele. Malfadado, porém, ele caiu da escada dessa biblioteca e morreu. Em 1556.

O Sher Mandal, torre octagonal construída em arenito vermelho. Foi observatório e também biblioteca, de onde caiu Humayun, Sultão do Império Mogol.
Sua esposa, inconformada, mandou construir uma bela tumba para o finado marido. É a Tumba de Humayun, que eu visitei outro desses dias. De certa forma é o oposto do Taj Mahal, que é um mausoléu construído pelo imperador por conta da morte de sua amada (mas o Taj só entra em cena um século depois). Seguem algumas imagens do local.

Portão de entrada para os jardins da Tumba de Humayun. Construção de 1562, a mando de sua viúva.



A Tumba de Humayun
Esta é a Tumba de Isa Khan, um nobre afegão. Sua tumba se encontra nos mesmos jardins da de Humayun.
Vista lateral da tumba de Humayun. Aqui mais pra baixo na foto, o nascedouro do atual rei de Delhi, Aedis aegypti.

domingo, 26 de setembro de 2010

Shaka e Chakka

Estavam me perguntando se eu já achei o Shaka (de Virgem) aqui na Índia. Não, se eu vir algum loiro de cabelo comprido eu digo. (E pra andar de olhos fechados aqui nesse trânsito de Délhi, vai precisar mesmo ter atingido o Arayashiki, hehehe).

Eu não achei o Shaka mas achei o Chakka. É esse tipo de iogurte aí embaixo, que achei esta semana. A embalagem é muito esclarecedora, é claro. Comprei na cara e na coragem (e na curiosidade). Acabou sendo bonzinho, mas é meio carregado no açúcar (oh, que surpresa). Duas colheres e você já está empurrando pra longe com a mão. Aí amanhã mais duas colheres... eu tenho mais 5 dias pra acabar, é o tempo que ainda tenho aqui em Délhi antes de pegar a estrada. Não estraga não, tá na geladeira, e com esse tanto de açúcar eu duvido que dê problema.

Em miúdos, o chakka que eu achei é de limão. É esse iogurte grosso cheio de açúcar e com gosto de fruta (digo "gosto de fruta" porque sabe-se lá se tem alguma fruta mesmo aí dentro...). Pra quem curte uma coisa açucarada, não é mau.

Chakka, uma espécie de iogurte grosso vendido aqui na Índia, misturado com açúcar e gosto de fruta (ou baunilha, etc.)

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Diversidade cultural


Num post anterior eu mencionei a feira de cultura que está que rolando aqui em Nova Délhi este mês. O propósito é fazer conhecer as várias culturas que existem dentro da Índia. Sim, é um país só, mas com uma diversidade interna imensa. "Unidade na diversidade", é o lema que inspira a Índia e que hoje em dia vem sendo adotado pelos europeus também, pra tentar pôr pra frente a União Européia.



A Índia como país é uma idéia que só virou realidade em 1947, com a independência da Inglaterra. Mas se engana quem acha que, antes da chegada dos ingleses, havia aqui um país bonitinho, organizado, com pessoas que se amavam. Havia um conjunto de povos com aparências diferentes entre si, falando línguas diferentes, com religiões diferentes (islamismo, budismo, hinduísmo...), e que habitavam esta parte do continente - as chamadas "Índias". Os ingleses só precisaram - em bom estilo europeu, como feito nas Américas - botar uns contra os outros, libertar A do domínio de B, e voilà, em pouco tempo a Companhia das Índias Orientais é quem dava as cartas por aqui.

Em 1947, quando se libertaram, as áreas de maioria islâmica decidiram que queriam ser independentes, e assim surgiram os atuais Paquistão e Bangladesh (veja no mapa ali do lado). O restante basicamente virou Índia. Mas não é porque se tornou um país único que a região inteira virou uma coisa só. São 22 línguas oficiais, quase que uma diferente pra cada um dos 28 estados. Dá uma sacada nessa placa de "Bem vindo" aí abaixo.


Entrada do Dilli Haat, uma feira de cultura indiana em Nova Délhi. Na placa, "bem vindo" em vários idiomas oficiais da Índia. Note os diferentes alfabetos.

Sim, são inclusive alfabetos diferentes em muitos dos casos. E, não, as línguas não são sempre parecidas umas com as outras. Tâmil, idioma de um dos estados do sul, é tão parecido com Hindi quanto português e japonês. (São inclusive famílias linguísticas diferentes; enquanto que os estados do norte tem quase sempre línguas da família Indo-Européia, as do sul são da família Dravídica).

Pra quem está curioso, seguem aqui alguns estados e as línguas principais de cada um. Há uma tentativa por parte de Delhi de impôr o Hindi como língua nacional, mas os povos do sul, cuja língua não tem nada a ver com o hindi, rejeitam isso. No fim das contas, acaba sendo o inglês que conecta os indianos.

Andhra Pradesh: Télugo (74 milhões de falantes)
Assam: Assamês (13 milhões de falantes)
Bengala do Oeste: Bengali (83 milhões na Índia, mais Bangladesh)
Gujarat: Gujarati (45 milhões)
Karnataka: Kannada (38 milhões)
Kerala: Malayalam (33 milhões)
Maharashtra: Marathi (72 milhões)
Orissa: Oriya (33 milhões)
Punjab: Punjabi (29 milhões na Índia, outros mais no Paquistão, onde o Punjab continua).
Tamil Nadu: Tâmil (61 milhões)

E esses são só alguns exemplos. Como eu disse, são 22 línguas oficiais mais centenas de dialetos. Vejam inclusive que muitas dessas línguas estaduais são mais faladas do que idiomas europeus inteiros, como o grego ou o polonês.

Haja diversidade. (*Um gole do suco oleoso enquanto escrevo*, estou quase acabando a garrafa que comprei). Fui portanto mais de uma vez nessa feirinha aí de que falei, pra tentar conhecer melhor as pecularidades de cada estado. Numa dessas batidas de perna por lá, resolvi parar pra comprar roupa, hehe.

O mercador era (ou dizia ser) do estado de Gujarat. E me perguntou, "De onde você é?". "Brasil". "Êêêê Brasiiiilllll... Kaká, Robinho, Felipe Melo... quer dizer, Felipe Melo not good".

Divertido o tio, mas contador de histórias. Queria me fazer crer, como todo vendedor de roupas (inclusive aí no Brasil), que os bordados eram todos à mão, e que ele era o designer e as mulheres costuravam. Atrás, a mulher, que estava mexendo no celular, só dando risada.

Estande de venda de roupas na feira de cultura de Dilli Haat. Os vendedores ficam assim, sentados nas almofadas lhe mostrando os produtos. Esse dizia ser de Gujarat, e grande fã do Brasil.


Levei pouca coisa porque nesse conversê ele não quis baixar muito o preço. Mas havia outros. As cores são normalmente assim, cheias de vida.

De quebra, aproveitei pra filmar em duas ocasiões danças típicas que estavam sendo apresentadas. Peguei de dois estados, Mizoram e Orissa. Confiram aí abaixo. A primeira é mais descontraída, a segunda mais cerimoniosa.

Mizoram: http://www.youtube.com/watch?v=pJhb1JwNTF8

Orissa: http://www.youtube.com/watch?v=oMCKUPvjpYI

Festa na vizinhança

Era um dia de semana qualquer, e Mairon já estava aboletado na cama, pra dormir depois de um dia de labuta. De repente, aquela batucada do lado de fora. "O que é isso, tô na Índia ou no Pelourinho?".

Parecia ensaio do Olodum. Tá pensando que é só no Brasil que rolam esses reggaes de vizinhança? Fecharam a ruela do lado, jogaram uma cobertura de tenda, arrumaram umas cadeiras aqui e ali, e de repente o lugar parecia mais uma sala de visita do que uma ruela de bairro. Levantei. Fui de ceroulas mesmo pra a varanda, meio que tentando me esconder atrás do parapeito antes que algum vizinho me visse semi-nu e desse um escândalo. (Sim, aqui há no mínimo umas 14 janelas com vista para o meu quarto, e tipo, algumas a 5m daqui... é tipo casa de favela, tudo amontoado e juntinho).

Não parecia o tipo de festinha que qualquer um da rua chega e entra, ainda mais firanghi estrangeiro que nem eu, hehehe. Mas dei uma espiada, e gravei uma palhinha. Rolou dancinha como na novela. Tá no Youtube.


Festa na vizinhança

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Vai um docinho?


Esta manhã Seu Bhalla me surpreendeu com essa peculiar caixinha de doces. (E, em seu jeito característico, claro, me botou pra comer desses doces antes mesmo do chai da manhã; queria que eu pegasse um de cada e que continuasse). Bem, dessa caixa eu duvido que você encontre em qualquer lugar do ocidente. Nem grupo neo-nazista europeu se atreve a fazer uma coisa tão singela.

A questão é que, como alguns de vocês sabem, esse símbolo, a suástica, foi apropriado pelo nazismo mas é na verdade um símbolo muito antigo, característico aqui na Índia, onde ele é ainda utilizado por toda parte. Você o vê em pórticos de casas, acima das portas, em decoração de eventos... e em caixinhas de doce como essa aí, hehe. Significa bons auspícios, traz energia positiva.

Os doces, por sinal, estavam bonzinhos também. Um pouco carregados na manteiga (como muita coisa aqui no norte da Índia, em que eles usam manteiga pra cozinhar), mas bonzinhos. Aqueles branquinhos ali lembram um pouco bolo de puba, só que mais rígido. E, claro, desta vez Seu Bhalla não enfatizou, mas tem toda a pinta de serem de farinha de trigo.

sábado, 18 de setembro de 2010

Comendo na Índia


A comida é sempre uma parte marcante de qualquer cultura. E, em viagens, é uma coisa que eu pessoalmente adoro verificar. Na Europa eu sempre digo a eles que o Brasil é um "universo alimentar" diferente do deles - outras frutas, outros doces, outras receitas. (Eles às vezes custam a sacar isso). Na Índia, o "universo alimentar" deles aqui é riquíssimo. Em algumas coisas, parece com o nosso - no que se refere a certas frutas tropicais, por exemplo. Em outras, é completamente exótico.

Em posts anteriores eu já falei do chai, dos prantha, e do hábito de comer com bastante açúcar e pimenta. Em resumo, aqui é a terra de gostos acentuados e temperos fortes. Definitivamente não é a terra do purê de batata. 

Paneer (queijo) em um molho apimentado de espinafre
Vamos começar pelo simples. A Índia toda adora leite. Hoje fui informado por Dona Bhalla que são 5 litros de leite diários para a casa. Sem contar iogurte e queijo (aqui chamado de paneer [lê-se panir], cubinhos parecendo ricota que podem até ser sem gosto sozinhos, mas que nunca poderão ser acusados disso dentro de um forte molho indiano).

Quanto à base dos 'comes' que acompanham o leite, vou exemplificar com uma história. Outro dia num chai com o Tio Bhalla, ele em seu jeito todo pensativo, daqueles que não está lhe dizendo nem 20% do que está pensando, me pega um biscoitinho e suspende na direção da luz da lâmpada, como se estivesse examinando uma jóia, e começa, pausadamente: "Este biscoito...". (E eu já crente que ele ia dizer que era de nata, pra eu responder que no Brasil também se faz). "... é de farinha de trigo". Fãs de animê podem imaginar a super gota na minha cara. Aquela cara de dããããã, grande novidade biscoito de farinha de trigo. Mas em defesa do Tio Bhalla eu explico: O norte da Índia, onde eu estou, funciona à base de trigo; o sul funciona à base de arroz. Por isso os milhares de prantha que estou comendo, além desses biscoitos e outras coisas. Lá no sul, pelo que me dizem, se fazem biscoitinhos com farinha de arroz, daí a necessidade que o Sr. Bhalla sentiu de me dizer que aquele que estávamos comendo era de farinha de trigo.

Assim sendo, as refeições aqui (que se faz sempre com as mãos) sempre acompanham um pãozinho chato no norte da Índia, como na foto abaixo. (A propósito, esse foi meu almoço hoje). Atenção: esses pãezinhos não são prantha, pois são apenas massa. Lembrem-se que prantha tem planta dentro, hehe. Esses só de massa se chamam chapati (lê-se como se tivesse um T no começo da palavra).

Meu almoço de hoje, uma refeição simples: chapatis, esses pãezinhos feitos de massa de farinha de trigo, uma sopinha de verduras, e o molho apimentado ali abaixo. Nesse molho há bastante pimenta, daqueles que vem até os carocinhos da pimenta dentro, hehe. Vem dentro também pedaços de verdura tipo cenoura, ou de fruta tipo manga e limão, imersos no molho apimentado. No copo, lassi, que é tipo um iogurte batido, que pode ser bebido com açúcar ou com sal, e que ajuda a cortar a pimenta.
Não se iludam achando que é pouco. É, sim, uma refeição simples sem grandes coisas, mas em termos de quantidade os chapatis são acrescentados ali naquele pratinho à frente mais rapidamente do que você come. E a sopinha também vem mais. (Até o lassi teve um refill, na verdade. Um re-enchimento do copo). Como eu disse, as mulheres não se sentaram à mesa comigo até hoje - ficam na cozinha mandando mais comida pra a mesa. Depois que já não precisa trazer mais comida, aí sim elas pegam algo pra si e se sentem em algum lugar pra comer, depois que acabaram de servir.

Mas nem só de pão vive o homem. Aqui e ali eu resolvi descobrir uns suquinhos e as frutas daqui. Pra minha nostalgia, tomei suco de laranja-lima, que talvez alguns de vocês nem conheçam, mas que no Nordeste é conhecido e eu já não tomava há algum tempo. Achei aqui também um suco da fruta litchi, que talvez alguns de vocês já tenham provado. A fruta é daqui da Ásia, eu já tinha tomado dela tanto no Canadá quanto na Holanda em restaurante asiático, mas o que tomei aqui é mais forte. Mas o campeão até o momento é o suco de sea-buckthorn, uma fruta que não tem nem nome em português. Essa amarelinha aí da foto.

Sea-buckthorns, fruta da Ásia Central.
Com que frequência você bebe suco que é oleoso? Pois é, o suco dessas amarelinhas aí é oleoso, pois as danadinhas tem óleo na polpa. Dá até pra ver as várias "fases" na garrafa. Aí você dá aquela sacodida e, que nem eu, abre a garrafa pra cheirar. Quase caio de costas. (Tem foto da garrafa abaixo). Estou bebendo, e metade da garrafa já foi. Não é mau, é azedinho, mas o cheiro lembra uma mistura de suco de maracujá com lubrificante de camisinha.

Durante este mês todo está havendo uma exposição de cultura que inclui pratos das várias partes da Índia. Eu, claro, não deixei de conferir. Tive uma pitadinha de como é a comida do sul, à base de arroz. Comi um típico e delicioso risotto (que, obviamente, não se chama risotto), uma espécie de arroz temperado e misturado aos mais diversos companheiros, desde o queijo paneer mencionado acima até legumes, ovo, o que for. No meu, até cravo-da-índia veio dentro.
Chama-se biryani, e é um nome genérico que descreve esses mil-e-um tipos de arroz temperado. É de origem persa, mas hoje em dia já está incorporado na culinária indiana com variedades bem apreciadas. Segue abaixo o que eu comi. Dizem que os melhores são os da cidade de Hyderabad, no sul, que eu pretendo visitar. Portanto não será a última vez que vocês me verão falar de biryani, hehe.


Um biryani vegetariano, com mil-e-um temperos. Ali, acompanhando, uma porção de cebola roxa, um caldinho de gengibre (o verde), e uma pequena porção de coalhada, que ajuda a cortar a pimenta se necessário.

Pra finalizar esta sessão, que talvez já tenha deixado alguns de vocês com fome, algo mais que eu experimentei nessa feira de cultura e que é comum por várias partes da Índia. Esses aí abaixo na foto são legumes e verduras passados na farinha de grão-de-bico e fritos. Muito comum por toda a Índia, e se faz com diferentes vegetais, de batata a berinjela. É gostosinho. Chama-se pakorá. É bom mesmo "pakorá" meses e meses de comida ruim lá na Holanda. No copo, shikanji, a nossa velha garapa (água, limão e açúcar).

No copo, shikanji, a nossa conhecida garapa. No prato, pakorá, tipo uns pedaços de vegetais fritos com massa ao redor. No meio, como não podia deixar de ser, o molho picante.
Como eu disse, a culinária na Índia tem elementos semelhantes à nossa em algumas coisas, como no bom uso de especiarias (diferentemente da América do Norte e de boa parte da Europa), frutas cítricas e outras como manga, que aqui é bem comum também. Ao mesmo tempo, uma riqueza de pratos bem exótica e que às vezes dá água na boca.

Duas rodadas de tuk-tuk

E lá eu estava, saindo do Qutub Minar, essa área de ruínas históricas do post abaixo. Já estava escurecendo, a mosquitada sai ao ataque - como no Brasil. Mas eu resolvi que ainda queria ver mais coisa antes de voltar em casa. Tinha ouvido falar do famoso Templo da Lótus, um dos marcos de Delhi, e resolvi verificar.

Agora a parte emocionante: pegar um desses tiozinhos motoristas de tuk-tuk que aaaaaamam turistas. Claro, turista nunca sabe o preço de uma corrida, e eles aproveitam pra cobrar o dobro do que normalmente seria. Deixa eu explicar. O tuk-tuk tem um taxímetro (ou "tuk-tukímetro", como queira) mas aí é que entra o dilema: se você exige ir pelo medidor, eles fazem uma "circular" com você e pegam o caminho mais longo. A outra opção é, a que eles preferem, negociar o preço. Só que como negociar se você não faz idéia do preço justo?

Tio Bhalla havia me prevenido: "Bote ele pra ir pelo medidor e diga que vá por não-sei-aonde". E assim foi. O cara esperneou, tentou botar o preço, disse que o medidor estava com defeito, eu disse que então ia pegar outro tuk-tuk, e de repente o medidor ficou bom.

Olha aí ó, novinho até. No caminho passamos por um bocado de lugares diferentes. Barracos, avenidas, vi um grupo de vacas...  

Rodada de tuk-tuk. Em cima o preço, embaixo a kilometragem. Na rua, a zona que você espera: moto, tuk-tuk, bicicleta, ônibus velho, pedestre no meio dos carros e, de vez em quando, algumas vacas que ficam zanzeado pela cidade.

O interior do tuk-tuk lembra um pouco táxi brasileiro. Em vez de uma imagem de Nossa Senhora, tem adesivo de Krishna, ou imagenzinha de Lord Ganesha, etc. O cidadão normalmente dirige descalço (aliás, aqui eles fazem quase tudo descalço), e de dois em dois minutos dá uma cusparada - às vezes daquelas densas em que o cuspe custa a desprender. Como tudo é aberto, de vez em quando você toma umas salpicadas de água de poça também.

Mas entre mortos e feridos salvaram-se todos. Cheguei no Templo da Lótus. Dentro não há muito além de um amplo espaço de oração, com flores bem arranjadas, bancos de madeira, e um altar branco um tanto neutro. O espírito é servir a professante de qualquer religião - ou mesmo espiritualistas sem religião fixa. O Templo é construção da Fé Bahá'í. Alguns já devem ter visto o nome em perfil de Orkut, o povo sempre vê isso, nunca sabe o que é, e bota porque é exótico, hehe. Na verdade, essa fé é tipo uma religião universalista; diz que todas as grandes religiões no fundo compartilham os mesmos princípios, e prega a fé no Deus único e a união dos povos. Foi iniciada por um persa (atuais iranianos) no século XIX, Bahá'u'lláh.


Templo da Lótus, em Delhi. Todo em mármore branco com um total de 27 "pétalas". O Templo da Lótus é um local de oração da Fé Bahá'í, que abraça todas as religiões como iguais, argumentando que todas elas pregam os mesmos princípios básicos.
Hora da segunda rodada. Saindo do templo me senti um pedaço de carne; como é atração turística, no momento que eu passei do portão já vieram uns 3 ou 4 tuk-tukeiros pra cima de mim. "Ei ei ei!", não-sei-o-que, vambóra! vambóra! Tentei usar toda a minha serenidade recém-polida no templo da lótus. Eu disse que queria ir pra uma estação de metrô que eu sabia ser perto, eles não gostaram. Na verdade, eles detestam o metrô. Antigamente eles cruzavam a cidade, nesse tráfego que leva horas pra se ir de um ponto a outro; hoje em dia o passageiro só pede pra ir até o metrô, e pimba.

Aí vem eles com aquela cara de que quer o seu dinheiro e o olho de quem está bolando alguma coisa criativa pra lhe dizer. O indivíduo me solta: "É o dia final do Ramadã, é festa, eu lhe levo pra fazer umas compras e depois lhe deixo no metrô". Eu: "Que compras o quê meu amigo, eu quero ir pro metrô e pronto".

Não deu jeito, nenhum deles aceitou que eu não estivesse interessado em compras (não nos bazares onde eles recebem comissão pra levar turista, e onde tudo custa o olho da cara). Andei mais um pouco e achei um que me levasse. Aí você acerta um que aceite levar pelo medidor, e senta crente que a batalha acabou. No meio da corrida, a surpresa: "Eu vou lhe levar numa outra estação de metrô que é mais perto". Poutz.

- "Não, não, não, eu quero a que eu lhe disse".
- "Nessa estação que eu vou te levar você vai economizar 20 rúpias na passagem do metrô".

Aprendi que aqui na Índia é igual resposta de menina: "Talvez" quer dizer "Sim". E aqui "Não" quer dizer "talvez". Me disseram que pra dizer não mesmo, você ignora. Como eu respondi, ele tomou isso como um talvez e acabou me levando na tal outra estação. Acabou sendo mais perto mesmo, mas a história de economizar 20 rúpias estava aumentada. Enfim, deixei ele ficar com o troco, já que são miúdos mesmo.

É como um fulano me disse outro dia: "Eles fazem com os ocidentais em pequena escala o que o Ocidente faz com a gente em grande escala". Claro que não adiantaria dizer que eu, brasileiro, não estou envolvido nisso. Mas enfim, acho que no fundo é verdade.


quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Indo aonde o metrô não vai

Valeu a todos que começaram a acompanhar e pelos comentários deixados!!

Depois daquela ida ao templo eu voltei à companhia do Tio Bhalla pra o 'chai' da noite. Digo na companhia dele e não da família porque eu sou sumariamente ignorado pelas mulheres da casa - isto é, quando ele está presente. Nem cruzam o olhar comigo e nem se sentam à mesa com a gente. Participar da conversa então, nem pensar. (Embora a ajudante de Bengala do Oeste não fale inglês, Dona Bhalla fala). Isso eu sei porque, quando ele não está por perto, dá pra conversar tanto com ela quanto com... errr... bem, com a Bengalesa dá pra gesticular, etc. Pelo menos rola uma comunicação. E o menino de 9 anos também arrisca umas frases boas em inglês. (O de 6 anos só me olha, com aquela cara de "quem é esse barbudo aqui em casa?").

Depois do chai, antes de dormir, o banho. Fiz questão de inserir esta parte aqui porque, depois de muitos anos, estou tendo que tomar banho de cuia. Mania que a gente tem de tomar as coisas por garantido. Sempre acha que chuveiro sempre tem. Mas olha ali ó, o banquinho, o balde... Nem precisa explicar como funciona, né?

Falando em banheiro, só uma curiosidade: aqui eles não usam papel higiênico não, viu. Éééé... ficou chocado(a)? Achou que todo mundo usava papel? Eu tenho porque sou visita, mas o esquema aqui na Índia é na base da aguinha. Não é chuveirinho, é uma tina de água que você usa e limpa com a mão (esquerda, pois com a direita você come). Dar a mão esquerda pra apertar aqui é ofensa grave, você entende o porquê. Fique certo(a) de que "essa história de limpar com um pedaço de papel o que devia ser lavado" também é chocante pra eles. Mas depois eu conto mais dessas histórias. Chega de banheiro por agora.

Vamos pra algo mais ao ar livre. Pela manhã o Tio Bhalla, que me dá sempre umas dicas de onde ir e como chegar, me sugeriu visitar o Qutub Minar, um dos muitos monumentos deixados aqui em Delhi do tempo em que esta parte norte da Índia foi invadida por árabes e outros povos muçulmanos do centro da Ásia. (O Taj Mahal, por exemplo, não é uma construção hindu, é islâmica, dessa época aí). Então lá vou eu pra a rua de novo.

Meu caminho diário para a estação de metrô

A ida até o metrô é sempre essa beleza aí, uma perfusão de odores e a adrenalina de atravessar cada rua. Moto aqui não freia, buzina. Nesse pedaço aqui da cidade tem muitos dos ciclo-riquixás também, desse daí da foto. Tipo um táxi-bicicleta. Nesse dia estava até sequinho o chão. Imagina isso aí depois da chuvarada que dá aqui frequentemente. Are baba.

Mas pegando o metrô fui parar perto do Qutub Minar. Perto. Chegando na estação de metrô próxima perguntei ao guarda por onde que vai. Pra a minha surpresa, ele responde: "Qualquer ônibus ali do outro lado da rua passa lá. Custa 5 rúpias" (uns 20 centavos). Heh, começava a aventura.

Pelo preço eu deveria ter imaginado. O ônibus que eu entrei parecia uma mistura de pau de arara com camburão. O modelo é esse aí da foto, mas com gente saindo pelo ladrão. Sempre vai alguém literalmente do lado de fora, seguro naquelas barras ali na entrada de trás. Dentro é uma muvuca, e escuro. Não tem porta (ou tem, mas nunca fecha). Não tem catraca, tem um tiozinho que fica com umas tiras de papel na mão gritando lá e cá e apontando com o dedo "Você!", pra pagar. Lá vai 5 rúpias e me dá o papelzinho dizendo que eu paguei.

Finalmente cheguei. Indiano paga 10 rúpias pra visitar, estrangeiro paga 200. Se bobear, paga 300. Dei uma nota de 500, vira e mexe, o cara me volta 200 de troco. Eu fico olhando pra a cara dele e digo: "300 de troco, né". "É, 300", ele responde e dá o resto como se estivesse procurando a nota (e doido que eu tivesse ido embora antes que ele encontrasse...).

Mas pelo menos valeu a pena. O Qutub Minar em si é um minarete, tipo uma torre com o muezim, que do alto anuncia quando é hora de uma das cinco orações diárias dos muçulmanos. Além do minarete em si (72,5m de altura, o mais alto do mundo... e esse foi construído em 1193), tem também antigas mesquitas e tumbas de vários sultões da época.

O Qutub Minar (de 1193), cercado de ruínas de antigas mesquitas.
Indianas em seus belos trajes seguem em direção à tumba de um sultão que governou a região de Delhi em 1200
Tumba do sultão Shams-ud-din Iltumish, que ele mesmo construiu para si. Notem as pétalas de flores ali deixadas. Pela tradição islâmica, os restos mortais não estão ali propriamente dentro desse sarcófago não, mas sim numa cripta debaixo dessa tumba.
Pra sair de lá, depois da visita, não peguei o ônibus. Queria ir em outro lugar, então resolvi me aventurar com os tuk-tuks. Contarei a seguir como é que isso continua. Mas, por ora, e aí, já deu pra perceber o que eu quis dizer sobre Delhi ser uma cidade feia mas com "ilhas" de beleza?

domingo, 12 de setembro de 2010

Doze horas em Nova Délhi

Cheguei na casa ainda mal havia amanhecido. 5:30 da manhã e já havia certo tráfego nas ruas. O que mais se vê nas ruas são os tuk-tuks, ou auto-riquixás, como desse tiozinho aí na foto abaixo.

Auto-Riquixá, movido a gás, nas ruas de Nova Délhi

Arredores de onde estou morando em Delhi
Quer imaginar Nova Délhi? Primeiro de tudo, esqueça a ambientação da novela - que supostamente se dava numa cidade menor e mais tradicional. Imagine, em vez disso, o morro da Rocinha. Agora multiplique a extensão para kilômetros e mais kilômetros de casas construídas umas sobre as outras, becos, lamaçal, buraco, barracos e lixões... Pronto, agora basta imaginar que essa muvuca toda é hinduísta (roupas características, incenso nas barracas, imagens de Shiva aqui e ali, etc.).
 
Nova Délhi se parece com uma grande favela, feia, mas pontuada aqui e ali por monumentos e paragens que são belíssimas de disputar (e, algumas vezes, ganhar, em minha opinião) de lugares mais famosos na Europa. Além disso, tem a vantagem de não ser violenta como os subúrbios latino-americanos. Aqui eu ando pra lá e pra cá, às vezes você casas com portas abertas, sem grande criminalidade. Pelo menos isso!

Mas estava eu ainda me preparando para o primeiro dia. Na família: o tio da casa, a tia, a assistente que ajuda a cortar os temperos, e dois garotinhos muito simpáticos de 6 e 9 anos. Estava em meu quarto arrumando a bagagem, e fazendo hora pra tomar o café da manhã (que está incluso no que eu pago), quando ouvi sininhos badalando na cozinha. "Nossa, que chique eles, parece hotel", e fui animado saindo em direção à cozinha. Só que o sininho não era pra mim, era pra Lord Krishna. Em bom estilo Opash, estava lá a dona da casa balançando o sininho e acendendo incenso antes de "abrir" a cozinha - auspícios para o dia.

Não muito tempo depois o café estava servido. Digo, o chai. Já vem adoçado, então se você é daqueles(as) que pede "o meu com pouco açúcar por favor", se deu mal. Aliás, aqui em termos de comida já vão lhe dando, ninguém pergunta se você quer não (é igual avó aí no Brasil). Mas o chai é gostoso, é com leite e chá preto. No fim parece um café com leite só que com gosto de chá. Além disso, comemos uma espécie de pão fino redondo, do diâmetro de um palmo. Ele é esquentado na chapa com óleo, e vem quente. Pra ficar mais gorduroso, adicione manteiga à vontade, que derrete. Adicione também um molho picante daqueles de fazer você correr pra um gole de chai e queimar a língua. Bem, pra quem é baiano ou acostumado a pimenta, não há problema, só basta se acostumar a ter isso no café da manhã. Ah! O pãozinho chato se chama "Prantha", e vem com vegetais e alho dentro. (Fácil de lembrar o nome, né? Basta lembrar da sua empregada se referindo ao seu jardim, e lembrar que o pãozinho vem com planta dentro).

Acho que comi uns 5 "prantha" só nesse primeiro dia. O tiozinho não queria me deixar parar de comer não. E a servente (de Bengala do Oeste, fala Hindi e Bengali) cooperava gentilmente trazendo mais e mais. Eu já tava começando a tomar fôlego pra mastigar, e o tiozinho apontando com a mão e dizendo "Por favor" com aquela cara prestativa, e eu sem querer fazer desfeita.

Meia hora depois estava eu zonzo de tanto prantha, descendo a escada com o tio, que disse que ia me mostrar o caminho pra a estação de metrô. Pensei que íamos a pé, naquele labirinto de lamaçal, buraco e gente passando. Mas não, vamos de moto. Capacete, pra quê? Ah, eu acho que ainda não mencionei o nome do tiozinho: Mr. Bhalla. Nome muito auspicioso pra uma rodada de moto sem capacete nas ruas de Nova Délhi.

Chegamos sãos e salvos, embora muitas vezes eu achei que fôssemos bater ou que eu ia virar e cair de cara numa daquelas poças de lama multi-doença. Depois de decorar e passar de trás pra frente e de frente pra trás a rota com o tiozinho, segui (os indianos, pelo que tenho visto, adoram conversar com você como se fossem seu professor, fazem você completar a frase, etc.). Graças a Deus, o metrô é ótimo. Vai sempre cheio mas não chega a ser "lata de sardinha". Tem ar condicionado e é barato. (Contudo, entretanto, todavia, não leva a todas as partes da cidade. Mas isso são cenas dos próximos capítulos). No primeiro dia eu rodei um pouco a pé e visitei o Templo de Akshardham, da foto abaixo.


É todo um complexo em torno de um templo hinduísta de fazer você arregalar os olhos. Muito bonito por dentro e muito bem construído, com áreas informativas também, cinema com exibição de "documentários", passeio de barco por um "brinquedo" daqueles tipo de parque de diversão, numa área fechada e que você vai vendo os arredores, com narrador, só que sobre a história e cultura da Índia. Parece uma Disney hindu. E no templo em si você só entra descalço. A entrada nesse complexo é de graça mas cheia de segurança, e máquinas fotográficas são proibidas, por isso a vista só de longe aqui.

O interior do templo é limpo a ponto de você não sentir um grão de poeira no seu pé (mesmo ele sendo cheio de grandes pórticos e aberturas).

Delhi é assim, um mar de favela e sujeira, mas com "ilhas" de beleza monumental. E, o que é interessante no meu ponto de vista: nem sempre se tratam de monumentos antigos. Esse mesmo aí é de 2005. Ao contrário da Europa, onde as igrejas viraram atração turísticas, e as obras de impressionar e artes em geral são uma coisa de épocas passadas, muito diferentes do hoje em dia europeu, aqui na Índia não é assim. O hinduísmo é vivido claramente no dia dia, e os monumentos refletem uma cultura muito atual. A gente vai conversando disso um pouco mais nas semanas a seguir.

Chegando na Índia

Are baba, cheguei na Índia!
 
País rico de cultura, cheio de particularidades, e desde 2009 muito curioso aos olhos de quem viu a novela (ou simplesmente ouviu os comentários nas ruas). Estarei por aqui durante estes 3 próximos meses e compartilharei com vocês as minhas impressões conforme minhas andanças pelo país

Meu primeiro pit-stop é Nova Délhi, a capital, cidade de nada menos que 22 milhões de habitantes. Cheguei aqui de manhãzinha. Havia reservado acomodação com uma família, e o tio disse que ia me buscar no aeroporto.



Não imaginei que os famosos truques de passar-você-pra-trás já começariam tão cedo, no saguão. Fui lá eu comprar uma água mineral - as histórias de horror sobre a água da torneira de Nova Délhi são famosas, e reza a lenda que os turistas aqui escovam dente com água mineral ou com cerveja, porque até as gotas da água da torneira que você engolir por acidente já te levam para o trono. Sendo assim, fui atrás da água e vi uma promoção: 20 rúpias e você leva uma garrafa d'água com um jornal (isso dá uns 75 centavos, 30 rúpias dá mais ou menos 1 real). "Beleza", o baixinho sorridente e cheio de maneiras educadas "Yes, sir", enquanto sorria, pega a garrafa da minha mão pra escanear o código de barra atrás do caixa, e nisso pega o troco também, e num golpe de destreza de bater qualquer mágico de circo, o FÊ-LA-DA-**** trocou a garrafa por uma enchida com água de bebedouro, de torneira, ou sabe-se-lá de onde.

Só fui notar depois, quando peguei pra beber, e percebi que curiosamente não estava cheia até a borda - ao contrário de todas as da prateleira. Tarde demais pra reclamar, mas pelo menos saquei o golpe antes de beber.

Pois é, aqui os truques já vem receber a gente na chegada do aeroporto. Índia requer olho vivo, como eu continuei a descobrir.

Encontrei o Tio na saída do aeroporto e, às 5:30 da manhã, saímos pra o que seria o meu primeiro dia em Délhi.